CÂNTICO DOS CÂNTICOS, POEMA DEL PORTUGUÉS GONÇALO SALVADO (TAMBIÉN EN HEBREO). XXII ENCUENTRO DE POETAS IBEROAMERICANOS

 

1 Gonçalo Salvado (fotografía de Joaquim Brito)

Gonçalo Salvado (fotografía de Joaquim Brito)

 

 

 

Crear en Salamanca se complace en publicar un amplio poema de Gonçalo Salvado, quien nació en 1967, en Lisboa, donde reside, habiendo pasado toda  su infancia y juventud en Castelo Branco. Licenciado em Filosofia pela Universidade Católica Portuguesa de Lisboa, tem vindo a afirmar-se como um poeta exclusivo do amor, do erótico e do feminino. Publicou quinze livros de poesia: Quando (1996); Embriaguez (2001); Iridescências (2002); Encontro ao Luar (2003)–  álbum de serigrafias do artista francês de origem espanhola Xavier Vilató ( sobrinho-neto de uma das figuras mais emblemáticas do século XX: o  pintor universal  Pablo Picasso) que integra poemas de Iridescências; Cântico dos Cânticos – Poema (2007); Duplo Esplendor (2008); Entre a Vinha (2010); Corpo Todo (2010); Ardentia (2011); Seminal (2012); Outra Nudez (2014); Voluptuário (2015); Cântico dos Cânticos (2016) – livro em edição bilingue português/hebraico, cujo lançamentofoi acompanhado duma exposição bibliográfica sobre o Cântico dos Cânticos, primeira exposição realizada em Portugal e no Brasil sobre esta temática, principal influência da poesia do autor. Esta exposição estará patente na  Biblioteca Nacional de Portugal, em Lisboa, em 2020 ; Rubá’iyat Poemas do Amor e do Vinho 77 poemas para ler e degustar (2017) – primeiro “livro/garrafa” editado em Portugal – primeira antologia poética do autor;  Denudata (2018). Como antologiador,  publicou, em 1999, a transcriação Camões Amor Somente. O livro é uma tentativa de construção de um Cântico dos Cânticos e de uma Arte de Amar em língua portuguesa a partir de fragmentos da lírica, da épica e da dramaturgia camonianas.  É co-autor com Maria João Fernandes de várias antologias de poesia amorosa entre elas: Cerejas – Poemas de Amor de Autores Portugueses Contemporâneos (2004), prefaciada por Eduardo Lourenço, com posfácio de António Ramos Rosa e apresentada em Lisboa por Agustina Bessa-Luís; Cem Poemas (de Morrer) de Amor e Uma Cantiga Partindo-se – Antologia de Homenagem a João Roiz de Castelo Branco na Poesia de Língua Portuguesa (2017); A Chama Eterna O Cântico dos Cânticos na Poesia de Amor e na Cultura de Língua Portuguesa (inédito), com capa de Júlio Resende, e abertura de Agustina Bessa-Luís; Os Amantes de Pompeia na Poesia Amorosa Universal (a publicar brevemente).  Em 2013, participou na exposição colectiva “Artistes Poètes, Poètes Artistes – Poésie et Arts Visuels au XX e siècle au Portugal”, comissariada pela crítica de arte portuguesa Maria João Fernandes, Fundação Calouste Gulbenkian, Delegação em França, Paris. Nesse mesmo ano, a União Brasileira de Escritores do Rio de Janeiro atribui-lhe, pelo conjunto da sua obra poética, o Prémio literário Sophia de Mello Breyner Andresen. Acerca da sua poesia, pronunciou-se, entre outros, António Ramos Rosa: “Poeta lírico e erótico de um lirismo muito claro e muito perfeito, de uma claridade e unidade estilística extraordinárias.”

 

 

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Gonçalo Salvado está invitado por vez primera a participar en el XXII Encuentro de Poetas Iberoamericanos, que este octubre celebrará la poesía de San Juan de la Cruz y de Eunice Odio.

 

 

 

CÂNTICO DOS CÂNTICOS

– Poema 1

 

 

Entrádose ha la esposa

en el ameno huerto deseado,

y a su sabor reposa,

el cuello reclinado

sobre los dulces brazos del Amado.

 

San Juan de La Cruz

 

 

A amada repousa em seu enigma transparente.

Suave é a sua sombra.

Doce, a sua boca sobre o meu peito.

 

De noite,

o  lugar da claridade é onde a sua nudez

me revela o esplendor todo das estrelas.

 

E se ela é a confidência perfumada

que oculta a terra

eu sou a semente que lhe entrega

o seu alento de maior verdor.

 

A distância que nos separa cabe numa gota de água

mas o que nos une assemelha-se ao fogo que deflagra.

 

Sei que divago pelo seu corpo

em busca de uma ilha de frescura

para estabelecer a minha aliança íntima

com o rumor do mar.

 

Oh, os seus ombros de pura matéria alada e matinal!

Os seios delicados com odor a fruto e mel!

O ventre obcecante

generosamente aceso ao meu desejo

a oferecer-me a embriaguez do vinho

e a limpidez da água!

 

Ah, as carícias que lembram

a fragrância do orvalho

a desprender-se de uma corola aberta!

 

Ela é a fonte transparente

em que o mundo vivamente se refaz

e a torre inamovível

que sustém a minha melancólica esperança.

 

Sobre o teu corpo, amada,

que sou eu mais do que uma fria madrugada

à espera do calor inocente do sol?

 

Quero pronunciar o teu nome à primavera

para que irrompa no ar a delícia do nardo,

se propague no vento o cheiro do sândalo

e se espalhe na brisa a festa da canela,

o êxtase da mirra,

o esplendor do incenso.

 

 

3 Fotografía de José Amador Martín

Fotografía de José Amador Martín

 

Vem sobre a colina de antigos aromas

em deslumbrantes vagas de pura seiva apaixonada.

Vem e traz a memória verde das mais altas árvores

num fluvial apelo de horizontes largos e marinhos.

 

Conheço o rumor dos teus passos em todo o meu sangue

pelo ardor intenso com que da morte me esqueço.

 

És tão minha que aspiro o mesmo hálito que respiras

e estremeço como tu numa voluptuosa dança de açucenas.

E ainda que o ciúme dilarece

com ferozes espadas o meu peito,

todo o perdão me entregas, amada,

na candura benévola do teu olhar.

 

Quero cantar-te na doirada espessura da minha solidão

porque só na dor reside o poema que alcançou a luz.

Mas há palavras que agora jubilosas brilham

no impetuoso grito que te funda.

 

Beijarei teu dorso de fecunda melodia,

tua carne de mosto,

tua videira a mim prometida.

 

Adornarei teu pescoço de colares breves,  

teus formosos pés de suaves espumas

e em teu umbigo

beberei fundo o licor da romãzeira.

 

Derramarei sobre os teus cabelos

o olor feliz da macieira

e repousarei entre os teus seios

como bolsinha de mirra perfumada.

 

De cedros e ciprestes farei as traves

e o tecto de nossa casa; 

o nosso leito será só verdura

de vivas folhas iluminadas.

 

Ó cântaro transbordante de água!

Ó ânfora que numa só taça

me ofereces todo o vinho!

 

Como pode a minha sede saciar-se

se do fogo permaneces prisioneira?

 

De que noite surgiste

como anúncio da alvorada?

Que altas luzes te cercam?

De que claridade és fulgor

em minha sombra derramada

e me deixas longamente

entre lírios esquecido?

 

4 Fotografía de José Amador Martín

Fotografía de José Amador Martín

 

Pomba que te escondes entre as rochas

porque ocultas a tua face?

Não há ave que que por ti não cante

de amor inebriada.

 

Que flor,que pedra, que acesa nuvem

te mostrará minha morada?

 

Vem para mim como essência evolada

porque és nascente viva de todos os aromas.

 

 

 

1.

אֲהוּבָתִי נוֹפֶשֶׁת בְּחִידָתָהּ הַשְּׁקוּפָה.

עָדִין הוּא צִלָּהּ.

מָתוֹק הוּא טַעַם פִּיהָ עַל חָזִי.

בַּלַּיְלָה

מְקוֹם הָאוֹר הוּא זֶה שֶׁבּוֹ

מַעֲרֻמֶּיהָ חוֹשְׂפִים בְּפָנַי אֶת כָּל זֹהַר הַכּוֹכָבִים.

וְאִם הִיא הַסּוֹד הַכָּמוּס וְהָרֵיחָנִי

הַמַּטְמִיר אֶת הָאֲדָמָה,

הֲרֵינִי הַזֶּרַע הַמּוֹסֵר לָהּ

אֶת אוֹנוֹ עַתִִּיר הָרַעֲנַנּוּת.

הַמֶּרְחָק הַמַּפְרִיד בֵּינֵינוּ נִכְלָל בְּטִפַּת מַיִם,

אַךְ מַה שֶּׁמְּאַחֵד אוֹתָנוּ דּוֹמֶה לְאֵשׁ מִתְלַקַּחַת.

נָהִיר לִי שֶׁאֲנִי מְשׁוֹטֵט עַל גּוּפָהּ

בְּחִפּוּשׂ אַחַר אִי שֶׁל רַעֲנַנּוּת

כְּדֵי לְכְרֹת אֶת בְּרִיתִי הָאִינְטִימִית

עִם דְּכִי הַיָּם.

אוֹי, כְּתֵפֶיהָ עֲשׂוּיוֹת מֵחֹמֶר מְכֻנָּף זַךְ מֵהַבֹּקֶר!

שָׁדֶיהָ הָעֲדִינִים מַדִּיפִים רֵיחַ נִיחוֹחַ שֶׁל פֵּרוֹת וּדְבַשׁ

בִּטְנָהּ הַמַּסְעִירָה

דְּלוּקָה בִּנְדִיבוּת לִתְשׁוּקָתִי

הַמַּגִּישָׁה לִי אֶת שִׁכְרוֹן הַיַּיִן

וּצְלִילוּת הַמַּיִם!

5 Fotografía de José Amador Martín

Fotografía de José Amador Martín

אֲהָה, הַלִּטּוּפִים הַמַּזְכִּירִים

אֶת בְּשֹׂמֶת הַטַּל

הַנּוֹדֶפֶת מִכּוֹתֶרֶת פֶּרַח פְּתוּחָה!

הִיא הַמַּעְיָן הַשָּׁקוּף הַמֵּקִים

אֶת הָעוֹלָםלִתְחִיָּה בְּעֵרָנוּת

וְהַמִּגְדָל חֲסַר הַהֶנֵּד

הַמַּשְׁעִין אֶת תִּקְוָתִי הָעַגְמוּמִית.

עַל גּוּפֵךְ, אֲהוּבָתִי,

בַּמֶּה נִמְשַׁלְתִּי יוֹתֵר מֵאֲשֶׁר לְטֶרֶם בֹּקֶר קַר

שֶׁמְּחַכֶּה לְחֻמָּהּ הַתָּמִים שֶׁל הַשֶּׁמֶשׁ?

בִּרְצוֹנִי לַהֲגוֹת אֶת שְׁמֵךְ לָאָבִיב

עַל מְנַת שְׁיִּפְרֹץ לָאֲוִיר עִנּוּג הַנֵּרְדּ,

שֶׁיָּפוּץ בָּרוּחַ רֵיחַ הָאַלְגֹם,

וְתִתְפַּזֵּר בַּצַּפְרִיר חֲגִיגַת הַקִּנָּמוֹן,

הָאֶקְסְטָזָה שֶׁל הַמֹּר

וְיִפְעַת הַקְּטֹרֶת.

בּוֹאִי מֵעַל לְגִבְעַת הַנִּיחוֹחוֹת הָעַתִּיקִים

בְּנַחְשׁוֹלִים מַרְהִיבִים שֶׁל מֹהַל טָהוֹר וּמְאֹהָב.

בּוֹאִי וַהֲבִיאִי אֶת זֵכֶר הַיֶּרֶק מֵהָאִילָנוֹתהַגְּבוֹהִים בְּיוֹתֵר

בִּקְרִיאַת נָהָר לָאֳפָקִים רְחָבִים וְיַמִּיּים.

אֲנִי מַכִּיר אֶת אִוְשַׁת פְּסִיעוֹתַיִךְ בְּכָל חֶלְבִּי וְדָמִי

בְּשֶׁל הַלַּהַט הָעַז שֶׁמַּשְׁכִּיחַ מִמֶּנִּי אֶת הַמָּוֶת.

אַתְּ שֶׁלִי עַד שֶׁאֲנִי שׁוֹאֵף אֶת הַהֶבֶל שֶׁאַתְּ נוֹשֶׁמֶת

וְנִרְעָד כָּמוֹךְ בִּמְחוֹל שׁוֹשַׁנִּים שׁוֹקֵק.

וְאִם כִּי תְּשַׁסֵּעַ הַקִּנְאָה

בַּחֲרָבוֹת אַכְזָרִיּוֹת אֶת חָזִי,

הֲרֵי אֶת כָּל הַמְּחִילָה אַתְּ מוֹסֶרֶת לִי, אֲהוּבָתִי,

בִּתְמִימוּת מַבָּטֵךְ הַמֵּיטִיבָה.

אֲנִי חָפֵץ לְשׁוֹרֵר אוֹתָךְ בָּעֹבִי הַמּוּפָז לְגַלְמוּדִיּוּתִי

יַעַן כִּי רַק בְּמַכְאוֹב נָעוּץ הַשִּׁיר שֶׁהִשִֹּיג אֶת הָאוֹר.

אַךְ יֶשְׁנָן מִלִּים הַזּוֹהֲרוֹת עַתָּה מֵרֹב צָהֳלָה

בִּתְנוּפַת הַזְּעָקָההַבּוֹקַעַת מֵחֵיקֵךְ.

אֲנַשֵּׁק לְגַבֵּךְ שֶׁמַּנְגִינָתוֹ פּוֹרִיָּה,

לִבְשַׂר הַתִּירוֹשׁ שֶׁלָּךְ,

לְגַפְנֵךְ שֶׁהֻבְטְחָה לִי.

אֲקַשֵּׁט אֶת צַוָּארֵךְ בִּרְבִידִים קְצָרִים,

אֶת כַּפּוֹת רַגְלַיִךְ הַיָּפוֹת בִּקְצָפִים עֲנֻגִּים,

וּמִטַּבּוּרֵךְ אֶשְׁתֶּה עֲמֻקּוֹת אֶת לִיקֶר הָרִמּוֹן.

אֶצֹּק עַל שַׂעֲרוֹתַיִךְ

אֶת הַבֹּשֶׂם הַמְאֻשָּׁר שֶׁל הַתַּפּוּחַ

וְאָנוּחַ בֵּין שָׁדַיִךְ

כְּשַׂקִּיק מֹֹר מְבֻשָּׂם.

מֵאֲרָזִים וּמִבְּרוֹשִׁים אֶעֱשֶׂה אֶת הַקּוֹרוֹת

וְתִקְרַת בֵּיתֵנוּ;

יְצוּעֵנוּ יִהְיֶה רַקיֶרֶק

מֵעָלִים חַיִּים וּמוּאָרִים.

אוֹי לְךָ כַּד מָלֵא מַיִם עַל גְּדוֹתֶיךָ!

אוֹי לְךָ לָגִין אֲשֶׁר בְּגָבִיעַ אֶחָד בִּלְבַד

אַתָּה מַצִּיעַ לִי אֶת כָּל הַיַּיִן כֻּלּוֹ! 

כֵּיצָד אוּכַל לְהַרְווֹת אֶת צִמְאוֹנִי

אִם אַתְּ נִשְׁאֶרֶת כְּלוּאָה בָּאֵשׁ?

6 Fotografía de José Amador Martín

Fotografía de José Amador Martín

מֵאֵיזֶה לַיְלָה הֵגַחְתְּ

בְּתוֹר מְבַשֶּׂרֶת הַשַּׁחַר?

אֵלוּ אוֹרוֹת רָמִים מַקִּיפִים אוֹתָךְ?

מֵאֵיזֶה אוֹר הִנֵּךְ נְגוֹהָה

שֶׁנִּשְׁפְּכָה עַל צִלִּי וְאַתְּ מַשְׁאִירָה אוֹתִי

שָׁעָה אֲרֻכָּה שָׁכוּחַ בֵּין שׁוֹשַׁנִִּים?

יוֹנָה הַמִּסְתַּתֶּרֶת בֵּין סְלָעִים

מַדּוּעַ אַתְּ מַחְבִּיאָה אֶת פָּנַיִךְ?

אֵין עוֹף שֶׁלֹּא יְזַמֵּר בִּגְלַלֵךְ

שִׁכּוֹר מֵאַהֲבָה.

אֵיזֶה פֶּרַח, אֵיזוֹ אֶבֶן, אֵיזֶה עָנָן בָּהִיר

יַרְאֶה לָךְ אֶת מְקוֹם מְגוּרַי?

בּוֹאִי לִקְרַאתִי כְּתַמְצִית שֶׁהִתְנַדְּפָה

כִּי אַתְּהִנֵּךְ מָקוֹר חַי לְכָל הַנִּיחוֹחִים.

(Tradução do poema de Gonçalo Salvado para o hebraico de Francisco A. B. Costa Reis com revisão do texto por Yotvat Gluk.)

 

7 Fotografía de José Amador Martín

  Fotografía de José Amador Martín

8 Gonçalo Salvado en Castelo Branco (2018. Foto de Jacqueline Alencar)

Gonçalo Salvado en Castelo Branco (2018. Foto de Jacqueline Alencar)

 

 

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